A adoção do BIM (Building Information Modeling ou Modelagem da Informação da Construção) no Metrô de São Paulo teve seu ponto de partida há cerca de 9 anos e sua evolução é assunto de grande importância, uma vez que é conhecido seu expressivo potencial para geração de benefícios.
Este artigo apresenta a avaliação dos resultados obtidos nos primeiros projetos desenvolvidos em BIM e as melhorias concebidas para os próximos empreendimentos. Além disso, relata a chegada do BIM aos projetos executivos e as novas iniciativas em andamento com a criação de um núcleo específico para tratar deste assunto dentro da Companhia.
RESULTADOS DOS PRIMEIROS PROJETOS E O DESENVOLVIMENTO DE MELHORIAS
Os dois primeiros trabalhos que contemplaram o uso do BIM desde o edital de contratação foram os projetos básicos das estações Ponte Grande, da Linha 2-Verde, e Ipiranga, da Linha 15-Prata[1]. Ao final de cada um deles, foi realizada uma pesquisa com os envolvidos, que expressaram sua percepção quanto aos resultados obtidos com o uso do BIM. Estas informações, somadas às recomendações da literatura técnica, às boas práticas de mercado e ao próprio aprendizado dos metroviários com suas experiências trabalhando com o BIM, formaram um relevante conjunto de dados de entrada para o desenvolvimento de melhorias.
Embora a elaboração de modelos BIM nestes projetos tenha se concentrado nas disciplinas de arquitetura, estruturas e instalações hidráulicas, outras especialidades (como geotecnia, sistemas eletrônicos e eletromecânicos e o setor de operação metroviária) também colaboraram na análise destes modelos, fazendo comentários pertinentes à sua área de atuação. Participaram da pesquisa tanto os arquitetos e engenheiros responsáveis pela análise do projeto da Figura 1- Percepção de benefícios pelos envolvidos no projeto básico da Estação Ponte Grande (Fonte: Saccomano, D. M. 2015[2])
respectiva disciplina quanto os que atuaram como colaboradores. A projetista contratada também enviou suas contribuições, respondendo às perguntas propostas. Os aspectos de maior destaque são mostrados a seguir.
Benefícios alcançados e estratégias para ampliá-los
O resultado das pesquisas, tanto para Ponte Grande quanto para Ipiranga, mostra que os principais benefícios percebidos pelos participantes com relação ao projeto foram a facilidade na visualização, a antecipação de problemas e a maior compatibilidade (conforme se observa nas figuras 1 e 2).
Tais resultados correspondem ao que era esperado, visto que estes benefícios estão entre os mais comumente alcançados nas primeiras experiências com a utilização do BIM. E, ainda que existam outras possibilidades de ganho a serem exploradas, a obtenção de resultados como a antecipação de problemas de projeto gera vantagens de grande relevância, visto que resolvê-los em etapas posteriores seria muito mais custoso e trabalhoso (como se pode notar na figura 3).
A avaliação dos gráficos da figura 3 permite perceber também a correlação com outro aspecto abordado na pesquisa: dois em cada três respondentes consideraram que o tempo de elaboração e aprovação do projeto básico em BIM foi maior ou muito maior que o usual do processo em 2D. Apesar de uma parte deste aumento estar relacionada ao processo de amadurecimento do uso do BIM por parte do Metrô e do mercado, observa-se que, mesmo com a redução no tempo gasto em atividades não ligadas diretamente à concepção do projeto (por exemplo, uma verificação detalhada de compatibilidade entre plantas e cortes), seu tempo total pode aumentar, pois questões que seriam tratadas em etapas seguintes passaram a ser trabalhadas durante o projeto básico. Isso pode ser entendido como um sensato investimento de tempo, visto que os ganhos nas etapas posteriores do empreendimento são bem maiores que o tempo adicional consumido nesta etapa de projeto.

Figura 2 – Percepção de benefícios com o uso do BIM no projeto básico da Estação Ipiranga. Valores mais próximos de 5 (tonalidades azuis) indicam maiores ocorrências destes benefícios (Fonte: pesquisa realizada pelos autores)

Figura 3 – Relação entre esforço e impacto (Fonte: Guia 1 da coletânea BIM ABDI – MDIC)

Figura 4 – Obstáculos para o uso do BIM – Estação Ponte Grande (Fonte: Saccomano, D. M. 2015)

Figura 5 – Obstáculos para o uso do BIM – Estação Ipiranga (Fonte: pesquisa realizada pelos autores)
Adicionalmente, o Metrô está desenvolvendo estratégias para reduzir o tempo utilizado no processo de análise do projeto e atendimento de comentários. O uso de ferramentas de colaboração on line deverá permitir que o avanço do projeto seja acompanhado de maneira contínua (a qualquer momento), com a visualização e o acesso às informações facilitados e comentários disponibilizados periodicamente em ocasiões pré-estabelecidas, sem a necessidade de aguardar entregas formais e seus trâmites, ainda que elas continuem existindo e cumprindo suas funções relacionadas ao andamento do contrato.
Outro assunto para o qual estão sendo implantadas melhorias é a representação gráfica. Nos dois projetos, observou-se muita necessidade de acertos no processo de geração dos arquivos de desenhos (em extensão.dwg) a partir dos modelos BIM, o que fica indicado nas figuras 1 e 2 pela baixa percepção de benefícios por parte dos envolvidos. Como medida de mitigação, o Metrô está elaborando templates com pré-configurações que disciplinam e facilitam a geração de desenhos e sua impressão, ao mesmo tempo em que reavalia os padrões de representação gráfica, que foram definidos num contexto em que todo o trabalho era feito num processo em 2D.
A extração de quantitativos a partir dos modelos BIM também foi muito proveitosa nestes projetos para o Metrô e a projetista contratada. Seu uso foi parcial, uma vez que, em algumas disciplinas, somente os itens mais representativos para o orçamento foram retirados de modo automático dos modelos. Ainda assim, esta atividade teve um ganho muito significativo em termos de agilidade. Para potencializar os benefícios, o Metrô tem especificado a inserção de novos parâmetros que permitam extrair mais quantitativos dos modelos, inclusive de maneira indireta, sem demandar que mais componentes sejam modelados e carregados no arquivo do projeto. Além disso, está sendo estudada uma correspondência mais próxima entre os componentes do modelo BIM, os serviços da base de custo e sua codificação, de modo a aumentar o grau de automação do processo de definição de quantitativos. Ressalta-se também que mais disciplinas estão passando a ser desenvolvidas em BIM e, por consequência, uma maior parte dos quantitativos poderá ser determinada por meio da extração de informações dos modelos.
Destaca-se, ainda, a busca do Metrô em fazer uso da Verificação de Regras (conhecida também como “code checking”), que consiste em validar de maneira automática nos modelos BIM o atendimento a regras, requisitos e especificações de projeto pré-definidas, de modo que seu processo de análise se torne, ao mesmo tempo, mais completo e mais rápido.

Figura 6 – Projeto básico da Estação Ipiranga – vista geral: sobreposição dos modelos BIM de estruturas, acabamento e instalações hidráulicas Figura 7 – Modelo BIM contendo o novo túnel de ligação entre as estações Paulista (Linha 4-Amarela) e Consolação (Linha 2-Verde), bem como o poço de ventilação e ataque à obra e parte do sistema viário e das utilidades públicas. Facilidade na identificação de remanejamentos a serem feitos

Obstáculos identificados e ações para superá-los
As pesquisas também mensuraram os obstáculos existentes para o uso do BIM. O estudo das figuras 4 e 5 mostra que, em ambos os projetos, as principais necessidades estão ligadas à readequação dos cronogramas e dos contratos, à inclusão de outras disciplinas no processo de projeto em BIM e à mudança de cultura.
Para promover estas adequações, o Metrô está implantando ações como as que seguem abaixo. • Os pagamentos deixam de depender da entrega de desenhos em folha e passam a ser feitos com base em critérios pré-estabelecidos de avanço do projeto. • Os eventos de pagamento vinculam disciplinas cuja análise deve ser feita de modo conjunto. • A entrega dos desenhos em 2D para disciplinas desenvolvidas em BIM é transferida para os estágios em que as soluções de projeto já estão consolidadas, de forma a reduzir o tempo utilizado no trâmite de documentos e na avaliação de questões relacionadas à representação em plantas e cortes. • A apresentação de um documento com a estratégia de desenvolvimento dos projetos em BIM por parte da proponente é exigida ainda na fase licitação. • A experiência em BIM para alguns membros que compõem as equipes das empresas participantes da licitação se torna requisito obrigatório. • Uma quantidade bem maior de disciplinas passa a ter seus projetos elaborados em BIM.
Quanto às mudanças de caráter cultural, pode-se afirmar que são primordiais, pois estão relacionadas à essência do BIM: a colaboração. O sucesso na adoção de uma forma de trabalho em que colaborar é fundamental depende da presença de um modo de pensar no qual o trabalho conjunto é visto como prioridade. Assim, equipes com uma mentalidade colaborativa encontrarão no BIM uma boa maneira de concretizar ações que integrem as capacidades e percepções individuais para o benefício conjunto. Por outro lado, a tentativa de utilizar o BIM com foco excessivo nos ganhos individuais dificilmente trará resultados satisfatórios.
As duas pesquisas evidenciaram uma concordância geral, tanto entre metroviários quanto entre projetistas contratados, de que o BIM requer processos novos. Um exemplo vivenciado nas experiências das estações Ponte Grande e Ipiranga é a mudança na interação entre disciplinas: a participação da equipe de uma determinada especialidade no desenvolvimento do projeto de outra se tornou bem maior. Ao mesmo tempo, a grande maioria dos respondentes entende que falta cultura de mudança de processos no Metrô e nas contratadas. Isso ilustra a importância de serem trabalhados aspectos culturais, bem como a necessidade de se entender BIM muito mais como um processo e um modo de colaboração entre os envolvidos do que como um conjunto de softwares ou de objetos em três dimensões.
Diretrizes específicas
A pesquisa também gerou dados importantes sobre as diretrizes específicas de uso do BIM estabelecidas para o projeto da Estação Ipiranga, coletando a percepção tanto da equipe do Metrô quanto da projetista contratada. Nos dois grupos, as respostas mostraram que metade dos participantes considerou suficientes estas diretrizes, enquanto a outra metade as classificou como insuficientes. Isso indica que, embora as definições feitas para esse projeto representem um avanço considerável, ainda existe a necessidade de progredir no seu desenvolvimento, especialmente no que se refere a detalhar quais informações devem constar nos parâmetros dos objetos presentes nos modelos BIM de cada especialidade e como elas serão geridas e utilizadas de modo a se conseguir obter o benefício proporcionado pela presença delas.
Neste sentido, o documento que estabelece tais diretrizes passou por uma grande revisão, incorporando estas definições. As principais mudanças contemplam: • inclusão de tabela com as informações geométricas e não-geométricas requeridas; • maior detalhamento dos requisitos especificados para os modelos BIM; • inclusão de instruções de projeto para disciplinas que passarão a ser desenvolvidas em BIM; • definição de padrões para criação e utilização de objetos BIM; • determinação de procedimentos para a gestão da informação contida nos objetos BIM.
A CHEGADA DO BIM AOS PROJETOS EXECUTIVOS
Neste momento, estão em elaboração os dois primeiros projetos executivos contratados em BIM: a Estação Ipiranga, da Linha 15-Prata, e o novo túnel de ligação entre as estações Paulista (Linha 4-Amarela) e Consolação (Linha 2-Verde).
Neste novo túnel, projetos de disciplinas como escavações, impermeabilização, dados básicos e remanejamento de interferências devem ser desenvolvidos em BIM pela primeira vez, somando-se a arquitetura, estruturas (exceto armação) e instalações hidráulicas, que tiveram suas primeiras experiências nos projetos básicos das estações Ponte Grande e Ipiranga. Isso deve gerar benefícios muito relevantes relacionados à facilidade de visualização do projeto, à detecção e resolução de interferências, à compatibilização e colaboração entre diferentes especialidades e à extração automática de quantitativos. Espera-se também um aumento bastante significativo no grau de maturidade do Metrô em BIM, visto que mais colaboradores estão passando a trabalhar desta maneira.

Figura 8 – O núcleo BIM e suas iniciativas
Figura 9 – Capa do compêndio produzido no projeto inovAção BIM, detalhando objetivos e o avanço da maturidade
Além disso, o fato destes dois projetos serem distintos entre si por sua natureza, pela complexidade e pelo contexto de elaboração do respectivo projeto básico (o novo túnel foi desenvolvido em 2D enquanto Ipiranga teve boa parte das disciplinas em BIM) torna esta experiência mais ampla e rica (figuras 6 e 7).
O AVANÇO POR MEIO DO NÚCLEO BIM E SUAS INICIATIVAS
No início de 2019, foi criado o Núcleo de Modelagem da Informação da Construção (NMC), ligado à Diretoria de Engenharia, que formaliza e fortalece as ações de desenvolvimento do BIM. Sua equipe está trabalhando em iniciativas de caráter multidisciplinar, que têm pontos de interação entre si e atuam desde a criação de guias para referência e suporte a contratações até a formação e capacitação dos colaboradores, com o desenvolvimento de novas habilidades relacionadas ao uso do BIM (figura 8). Algumas destas inciativas estão listadas a seguir. • Estudo para implantação de um banco de dados espaciais corporativo, fazendo uso da integração entre BIM e GIS (Geographic Information System ou Sistema de Informações Geográficas). • Desenvolvimento de proposta com vistas a gerar ganhos econômicos aos empreendimentos de expansão utilizando o BIM para automação do levantamento de quantitativos associada à simulação de alternativas de projeto. • Definições para a criação de uma sala BIM para reuniões, de modo a fomentar o trabalho conjunto e agilizar as tomadas de decisões ao longo do projeto. Ao dispor de layout e equipamentos que facilitem o acesso e a visualização de informações relevantes do projeto, as reuniões se tornam mais produtivas e as soluções e definições são encontradas mais rapidamente. • Avanço do projeto inovAçãoBIM[3], que tem como finalidade conduzir a adoção do BIM e vem atuando durante os últimos três anos na divulgação de conhecimento, na criação e adequação de processos, na orientação às áreas que estão passando a fazer uso do BIM e na definição de seus objetivos estratégicos, os quais foram alinhados ao Plano de Negócios da companhia e cuidadosamente trabalhados por um comitê composto por membros de todas as suas diretorias. Em seguida, foram detalhados em diversas ações elaboradas com o intuito de assegurar a adequada gestão de informações (de projeto, execução, operação, manutenção e gestão de ativos), contribuir para a sustentabilidade financeira da empresa, potencializar a prospecção e a gestão de negócios e aumentar a eficácia das soluções de projeto. Este conteúdo foi disponibilizado numa publicação impressa, que também contempla a avaliação do aumento da maturidade em BIM no Metrô (figura 9).
Assim, o BIM é impulsionado em todos os aspectos considerados como seus fundamentos: estratégias, processos, tecnologias e pessoas. A partir deles, edifica-se toda a geração de benefícios alcançados por meio da Modelagem da Informação da Construção.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
[1] ENGENHARIA – Para mais informações sobre os projetos básicos das estações Ponte Grande e Ipiranga, consultar o artigo “O BIM nos Projetos Básicos do Metrô de São Paulo”, edição 638 da REVISTA ENGENHARIA, Engenho Editora Técnica Ltda./Instituto de Engenharia, disponível no ISSUU acesso pelo site (www.brasilengenharia.com).
[2] SACCOMANO, DANIEL MOZARTE – Análise de Projetos Básicos com Uso de Modelagem da Informação da Construção – BIM. Estudo de caso no Metrô de São Paulo. Monografia apresentada à EPUSP – MBA em Visão Integrada de Sistemas sobre Trilhos Urbanos. São Paulo – 2015. [3] ENGENHARIA – Para mais informações sobre o projeto InovAção BIM, consultar o artigo “A Adocão do BIM no Metrô de São Paulo”, edição 638 da REVISTA ENGENHARIA, Engenho Editora Técnica Ltda./Instituto de Engenharia, disponível no ISSUU acesso pelo site (www.brasilengenharia.com).
* Fernando José Fedato é engenheiro do Metrô-SP – E-mail: imprensa@metrosp.com.br ** Antonio Ivo Mainardi é arquiteto e urbanista do Metrô-SP – E-mail: imprensa@metrosp.com.br
Fonte: Revista Brasil Engenharia ed. 01/2020.